terça-feira, 27 de março de 2007

IBP no Brasil

Sem muito alarde, foi inaugurada neste mês de março a sede do Instituto do Bom Pastor no Brasil. O IBP é uma sociedade de vida apostólica de direito pontifício instituída pela Santa Sé em setembro do ano passado, conforme as regras do direito canônico, e já estava presente na França, Itália, Colômbia e Chile. O rito próprio do Instituto é única e exclusivamente a liturgia romana tradicional, nos termos dos livros de 1962. A sede brasileira foi instalada em São Paulo/SP e já estão sendo regularmente celebradas as Missas no rito de São Pio V (veja informações no quadro ao lado).

segunda-feira, 19 de março de 2007

Notícias do Motu Proprio

Segundo artigo de Marco Tosatti, divulgado sábado passado (17/03/2007) no jornal La Stampa, de Turim, o motu proprio liberando o uso da Missa Tridentina está pronto e deverá ser publicado entre a Festa da Anunciação (25 de março) e a Páscoa. Aparentemente, o documento é extremamente fundamentado ("blindatissimo") e, de acordo com fontes confiáveis, possibilitará que os fiéis (no mínimo 30) tenham o direito de pedir a celebração da Missa Tradicional em qualquer paróquia. A informação foi confirmada pelo vaticanista Luigi Accattoli, no Corriere della Sera de ontem (18/03/2006). No artigo "La Linea Ratzinger", ele afirma que alguns predizem a publicação do motu proprio para 25 de março, outros para a quinta-feira santa. Afirma ainda que a intenção do papa seria a de possibilitar "que vários ritos possam conviver, favorecendo mutuamente o pluralismo e a tradição".

quarta-feira, 14 de março de 2007

Sacramentum Caritatis

Tudo bem, não veio o esperado motu proprio liberando a Missa Tridentina – talvez agora ainda um pouco mais longe -, mas a Exortação Apostólica Pós-Sinodal Sacramentum Caritatis , divulgada ontem pelo Vaticano, destacou alguns pontos extremamente importantes em relação aos abusos na liturgia: "A relação entre mistério acreditado e mistério celebrado manifesta-se, de modo peculiar, no valor teológico e litúrgico da beleza. De facto, a liturgia, como aliás a revelação cristã, tem uma ligação intrínseca com a beleza: é esplendor da verdade (veritatis splendor). (...) Referimo-nos aqui a este atributo da beleza, vista não enquanto mero esteticismo, mas como modalidade com que a verdade do amor de Deus em Cristo nos alcança, fascina e arrebata, fazendo-nos sair de nós mesmos e atraindo-nos assim para a nossa verdadeira vocação: o amor" "A beleza da liturgia pertence a este mistério; é expressão excelsa da glória de Deus e, de certa forma, constitui o céu que desce à terra. O memorial do sacrifício redentor traz em si mesmo os traços daquela beleza de Jesus testemunhada por Pedro, Tiago e João, quando o Mestre, a caminho de Jerusalém, quis transfigurar-Se diante deles (Mc 9, 2). Concluindo, a beleza não é um factor decorativo da acção litúrgica, mas seu elemento constitutivo, enquanto atributo do próprio Deus e da sua revelação. Tudo isto nos há-de tornar conscientes da atenção que se deve prestar à acção litúrgica para que brilhe segundo a sua própria natureza". "37. Visto que a liturgia eucarística é essencialmente acção de Deus (actio Dei) que nos envolve em Jesus por meio do Espírito, o seu fundamento não está à mercê do nosso arbítrio e não pode suportar a chantagem das modas passageiras. Vale aqui também, sem dúvida, a advertência de São Paulo: « Ninguém pode pôr outro fundamento diferente do que foi posto, isto é, Jesus Cristo » (1 Cor 3, 11)". "a arte da celebração é a melhor condição para a participação activa (actuosa participatio).(114) Aquela resulta da fiel obediência às normas litúrgicas na sua integridade, pois é precisamente este modo de celebrar que, há dois mil anos, garante a vida de fé de todos os crentes, chamados a viver a celebração enquanto povo de Deus, sacerdócio real, nação santa (1 Pd 2, 4-5.9).(115)". "Verdadeiramente, em liturgia, não podemos dizer que tanto vale um cântico como outro; a propósito, é necessário evitar a improvisação genérica ou a introdução de géneros musicais que não respeitem o sentido da liturgia. Enquanto elemento litúrgico, o canto deve integrar-se na forma própria da celebração; (128) consequentemente, tudo — no texto, na melodia, na execução — deve corresponder ao sentido do mistério celebrado, às várias partes do rito e aos diferentes tempos litúrgicos.(129) Enfim, embora tendo em conta as distintas orientações e as diferentes e amplamente louváveis tradições, desejo — como foi pedido pelos padres sinodais — que se valorize adequadamente o canto gregoriano,(130) como canto próprio da liturgia romana.(131)". "A este respeito, porém, durante o Sínodo dos Bispos foi sublinhada a conveniência de moderar este gesto (a saudação da paz), que pode assumir expressões excessivas, suscitando um pouco de confusão na assembleia precisamente antes da comunhão. É bom lembrar que nada tira ao alto valor do gesto a sobriedade necessária para se manter um clima apropriado à celebração, limitando, por exemplo, a saudação da paz a quem está mais próximo.(150)". "A fim de exprimir melhor a unidade e a universalidade da Igreja, quero recomendar o que foi sugerido pelo Sínodo dos Bispos, em sintonia com as directrizes do Concílio Vaticano II: (182) exceptuando as leituras, a homilia e a oração dos fiéis, é bom que tais celebrações sejam em língua latina; sejam igualmente recitadas em latim as orações mais conhecidas (183) da tradição da Igreja e, eventualmente, entoadas algumas partes em canto gregoriano. A nível geral, peço que os futuros sacerdotes sejam preparados, desde o tempo do seminário, para compreender e celebrar a Santa Missa em latim, bem como para usar textos latinos e entoar o canto gregoriano; nem se transcure a possibilidade de formar os próprios fiéis para saberem, em latim, as orações mais comuns e cantarem, em gregoriano, determinadas partes da liturgia".

segunda-feira, 12 de março de 2007

Missale Romanum

Outro dia alguém me perguntou se eu era católico praticante. Fiquei um tempo pensando se haveria algum outro modo de ser católico, e depois disse que sim. "Ah, então você tem que ir à Missa?" Fiquei outro tempo pensando em como eu iria explicar que os sacramentos são dons gratuitos destinados à nossa salvação, por amor de Deus à humanidade. Que seria no mínimo estupidez fazer pouco caso deles, mais ou menos como tocar fogo no bote salva-vidas quando o navio está prestes a afundar. Que, entre todos, a Eucaristia instituída por Cristo na Última Ceia é o centro da vida cristã, e que, como católico, eu acredito na Presença Real: em como explicar que, por algum modo sublime e misterioso, aquela hóstia recebida na comunhão não é um simples pedaço de pão, mas verdadeiramente o Corpo de Cristo, e que o vinho consagrado também é verdadeiramente o Seu Sangue. E que por isso o sacrifício do Calvário é renovado a toda e cada Santa Missa celebrada, ou seja, que Cristo está ali, morrendo novamente por você, e você simplesmente não quer estar lá? De modo que naquele momento eu fiquei meio sem jeito e respondi apenas que não conseguia imaginar porque alguém iria obrigado à Missa. A conversa tomou outro caminho e fui embora pensando em tudo aquilo, em como, mesmo entre católicos, poucas pessoas têm hoje em dia uma noção exata do sentido sobrenatural que envolve o sacrifício da Missa, um senso do próprio Mistério. E não posso deixar de ter a mais absoluta certeza de que os abusos na liturgia são o grande culpado por esse descolamento da realidade religiosa. A ambigüidade do Concílio Vaticano II – especificamente na instituição do Novus Ordo - abriu a possibilidade de verdadeiras profanações e, com isso, da perda total do sentido da Missa. São as danças, as palmas, as músicas profanas – já condenadas em documentos recentes do Vaticano (a Instrução Redemptionis Sacramentum; a Encíclica Ecclesia de Eucharistia) -, o desdém de muitos padres na hora da Comunhão, a politização das homilias, a transformação da "Paz" em um evento interminável, onde as pessoas se abraçam e se beijam, enfim, diversos fatores que apenas confundem os fiéis, dando a entender que o sacrifício da Missa é apenas uma grande festa da comunidade. Nada mais. O sentido do Mistério fica completamente descartado, em troca de uma celebração materialista onde se fala de tudo, menos da salvação das almas. Eu penso na verdadeira devoção dos Santos pela Santa Missa e fico imaginando o choque que essa "protestantização" lhes iria causar. O Padre Pio (São Pio de Pietrelcina), que teve a graça de receber os estigmas de Cristo, chorava e sofria durante toda a celebração que realizava, e, ao ser perguntado como deveríamos assistir à Missa, respondia: "Como assistiram a Santíssima Virgem e as piedosas mulheres. Como assistiu S. João Evangelista ao Sacrifício Eucarístico e ao Sacrifício cruento da Cruz". E você sambando? Batendo palmas? É por isso que a preservação da liturgia é a preservação do próprio Mistério da Cruz. A preservação da realidade da Paixão. Mas a morte não é assunto muito popular. "Espanta fiéis". E esse véu sobre o sofrimento acaba se tornando também um véu na consciência sobre a própria Verdade. Mas o fato é que falar dessa preservação litúrgica significa falar na Missa Tridentina, promulgada pelo Concílio de Trento em 1570, quando foram unificados os ritos sacramentais da Santa Missa utilizados pela Igreja desde os primórdios do Catolicismo, até o Vaticano II. É impossível deixar de imaginar que, se houvesse uma máquina do tempo e alguém se dispusesse a voltar para, vamos dizer, Nicéia em 780, Florença em 1368, ou, mais recentemente, Coréia em 1950, provavelmente assistiria à mesma celebração. E como não ver beleza nisso? O Santo Padre, Papa Bento XVI, vem anunciando a liberação irrestrita da Missa de sempre - assim declarada e garantida por São Pio V na Bula Quo primo tempore -, com intenção de facilitar uma celebração que atualmente necessita da autorização – na maior parte das vezes recusada – do Bispo local. E liberar a Missa Tradicional significa possibilitar ao maior número de pessoas a mais perfeita forma de expressão da Fé na Sagrada Eucaristia, uma garantia contra profanações, o acesso a um tesouro cultural da humanidade, a coibição a liberdades pessoais de ortodoxia duvidosa, significa prover senso de Mistério e do sobrenatural, a restauração da humildade e reverência (resguardando a consciência da Presença Real), e, por tudo isso, significa mesmo um retorno à continuidade litúrgica, com toda a sua riqueza teológica. É a possibilidade de estender a muitos a oportunidade de participar do Santo Sacrifício, tal como foi sempre celebrado. De outro lado, é evidente que a nova Missa constitui sacramento válido e que pode chegar a proporcionar um sentido sobrenatural do Mistério, sem deturpação. Basta assistir ao rito novo celebrado em latim – como faz o Opus Dei, por exemplo -, ou à celebração solene de alguns mosteiros ou do próprio Vaticano, com canto gregoriano ou polifonia, para notar que isso é possível. Mas, de verdade, temo que as celebrações corretas sejam as exceções que apenas confirmam a regra. A possibilidade de más celebrações e de profanação da Verdade são mesmo uma janela aberta ao infinito, no Novus Ordo. Ainda assim, nada justifica a revolta tradicionalista de grupos cismáticos. Por mais justa que a causa pareça, se um Papa lhe roga "pelas Chagas de Cristo" que não faça algo – seja beber um copo d’água, atravessar a rua ou ordenar sacerdotes -, você simplesmente não faz. Prudentia est recta ratio agibilium, já dizia Santo Tomás. A lição é essa. Na dúvida, sempre com o Papa. E Santo Tomás.